Memória e Património




Créditos: Patrícia Azevedo Godinho


Ao falarmos de memória estamos a falar da memória individual, da memória familiar e da memória coletiva. A memória é plural, e nela cabemos nós ou é através delas – das memórias – que nos construímos: individualmente, no seio da nossa família e no seio das nossas comunidades.

É nesta memória – plural – que encontramos outros conceitos como património e identidade. São as memórias que nos fazem, que nos constroem e também contribuem para os seres que somos. São então elas que estão na base do processo de identidade, aliadas a valores históricos, artísticos, culturais, naturais, sociais, ... São as memórias que, ao querermos que se mantenham “vivas”, se “materializam” em edifícios históricos, monumentos, paisagens naturais, objetos arqueológicos, obras de arte, objetos de adorno, cantares, danças, objetos de trabalho, modos de fazer, ... e a todas estas memórias, um património.

Acontece atualmente, e um pouco por todo o mundo, a crescente valorização do património e, mais do que isso, da diversidade de patrimónios, isto é, a diversidade cultural. É através desta preocupação, latente em cada região e em cada país, que a diversidade cultural é preservada através dos testemunhos históricos, mantendo vivas, na memória das comunidades, as memórias que na maior parte das vezes não foram vividas por esses indivíduos (MENDES, 2009, p.13). Tal como José Amado Mendes (2009: 13) refere “O património e os próprios monumentos/documentos permitem recordar e ajudam a operacionalizar o processo de memorização.”. Assim, com os monumentos, para além de se edificar o que se pretende homenagear prevalece a ideia de se manter viva, na memória das pessoas, o que esse monumento representa, mesmo sabendo que as gerações mais novas não viveram esse determinado episódio da história (local ou nacional) que se está a prestar homenagem (MENDES, 2009, p.13). E tal também é válido em cada conjunto arquitetónico preservado, em cada escavação arqueológica iniciada, em cada saber valorizado, em cada pessoa da comunidade (pescador, artesão, construtor, cozinheiro, ...), em cada paisagem natural validada enquanto património da humanidade,... em cada ponte, em cada calçada romana, em cada moeda, em cada ponta de seta, em cada anel, em cada panela, em cada rede de pesca, em cada anzol, em cada moinho, em cada azulejo, em cada igreja e capela, ... Em todos eles memórias. Memórias construídas, entendidas, compreendidas à luz da história, dos acontecimentos, das vivências, dos tempos, de outros tempos.

Tal como Elsa Peralta e Marta Anico (2006:1) nos esclarecem, “verifica-se que a partir de um dado momento se interiorizou a ideia de que o património é ‘bom’ e que ‘perdê-lo’ implica também ‘perder’ identidade e que isso é ‘mau’ e, portanto, deve ser evitado.”. Neste sentido, a ideia de identidade passou, sem dúvida, a ser um conceito presente nas preocupações políticas sendo que, é através da identidade que se constrói uma comunidade regida por valores de defesa e preservação patrimonial, das memórias locais e, consequentemente, das do seu país. Os novos modelos políticos regem-se, em grande medida, pela inter-relação com o território, as comunidades e a cultura (PERALTA & ANICO, 2006) e afirmam a necessidade em demonstrar que existem culturas específicas e, portanto, diversidade cultural que deve ser preservada.

Temos então que refletir sobre: como ou qual a melhor forma das pessoas criarem a sua identidade? Como será o processo de identificação com o passado? Será através dos feitos nacionais ou dos locais?

Mendes (2009) refere que este processo de identificação deve ser feito primeiramente ao nível local. Deste modo, e pela grande circulação de pessoas e mensagens neste mundo global, e pela grande necessidade de afirmação cultural num mundo que é diverso, assiste-se a uma intensificação da revalorização do local através da proliferação de museus locais (ANICO, 2008, p. 35). É nesta revalorização do local e, consequentemente, do nacional, que reside a construção da memória, da identidade mais profunda de uma comunidade.

(...)"


Este texto faz parte do artigo "O contributo da Educação Patrimonial na construção da memória" publicado na revista V!RUS:

GODINHO, P. O contributo da Educação Patrimonial na construção da memória. V!RUS, São Carlos, n. 15, 2017. [online] Disponível em: http://www.nomads.usp.br/virus/virus15/?sec=5&item=81&lang=pt. Acesso em: 25 01. 2018.



Bibliografia

ANICO, Marta, 2008. Museus e pós-modernidade : discursos e performances em contextos museológicos locais. Lisboa: UTL-ISCSP.

MENDES, J. Amado, 2009. Estudos do Património: Museus e Educação. Coimbra: Imprensa Nacional de Coimbra.

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